Cursos Livres 2022.1 do Instituto Humanitas

Os Cursos Livres são uma atividade de extensão do Instituto Humanitas de Estudos Integrados, com programação regular desde 2019. O histórico de Cursos Livres pode ser visualizado no Portal web do Instituto.

As inscrições, para os alunos da UFRN, são feitas exclusivamente via SIGAA, tendo caráter de atividade de extensão. Para o público em geral interessado, os Cursos Livres são gratuitos e abertos.

A programação de Cursos Livres do semestre 2022.1, com conferências mensais entre fevereiro e junho deste ano, é resultado do diálogo do curador dos Cursos Livres, o professor Lucas Trindade da Silva, com as e os discentes do Bacharelado Interdisciplinar em Humanidades da UFRN, curso de graduação vinculado ao IH. A partir de uma seleção das temáticas sugeridas pelas e pelos estudantes, chegamos a uma programação diversa, congregando temas atuais de indiscutível relevância científica, cultural e política, a serem aprofundados por pesquisadoras e pesquisadores de diversas instituições a nível nacional (UFRPE, UFOPA, UFRN, USP) e internacional (Universidade técnica de Dresden). A seguir, apresentamos os dados de cada curso livre e os resumos das propostas.


O curso livre “Reflexões sobre um conceito sociológico de tecnologia para a observação etnográfica da robótica humanoide” terá como conferencista Augusto Francisco, doutorando na Universidade Técnica de Dresden, e será realizado em formato virtual no dia 24 de fevereiro de 2022, às 14h (horário de Brasília).

Resumo: O presente trabalho procura identificar um conceito sociológico de tecnologia que contribua com a elucidação de uma questão recorrente nas ciências sociais: por mínima que seja, é possível haver uma ação social efetuada pela tecnologia? Essa questão desdobra-se em outras tantas questões como, por exemplo, um robô pode agir socialmente? À primeira vista, o tipo específico de robô chamado de “humanoide” seria um objeto bastante adequado para colocar essas questões à prova. Uma vez que o adjetivo humanoide denota que algo é similar ao humano, a questão da tecnologia como ação no sentido social poderia encontrar respostas que enxergassem mais longe. Um robô humanoide parece ser a máxima aproximação com o humano, no sentido de ela poder agir. É nesse contexto que o um conceito será colocado. Baseado na teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann, Jost Halfmann apresenta um conceito de tecnologia que sempre compete com “contra-conceitos” que a explicam, se tomarmos uma breve história do pensamento sobre ela. Por exemplo, na antiguidade, ela se diferencia da natureza como algo que não pode reproduzir-se a si mesmo. Essas diferenciações foram justificadas, consequentemente, em relação a contra-conceitos como (seguindo uma certa cronologia): natureza, Deus, homem, sociedade e, atualmente, segundo Halfmann, sistemas sociais / comunicação. Em tal conceito diferenciador, ela não ultrapassa a qualidade de meio de comunicação entre sistemas sociais. Portanto, em termos teóricos, por essa perspectiva, a tecnologia não seria capaz de agir. Do ponto de visto concreto, a etnografia da robótica humanoide com a qual tenho contribuído dá sinais preliminares de que o assunto é consideravelmente complexo uma vez que, como aponta Halfmann, ela pode de repente deixar de ser um meio de comunicação e assumir uma qualidade irritante de instalação, quando não funciona como deveria.


O curso livre “Algumas notas sobre o pensamento afro-diaspórico: o ‘cinema de cozinha’ feito por mulheres negras” terá como conferencista Carla Ramos Munzanzu, professora da Universidade Federal do Oeste do Pará e Doutora pela University of Texas (Austin), e será realizado em formato virtual no dia 08 de abril de 2022, às 16h (horário de Brasília).

Resumo: Tema que tem centralidade no campo dos chamados “Estudos Negros” (Black Studies, Africana Studies e African Diaspora Studies), as linguagens artísticas têm sido um importante lugar de produção e experimentação teórica e metodológica para artistas e intelectuais-artistas negras e negros na diáspora africana. Tomando essa tendência como caminho de aproximação à obra de duas cineastas negras da Bahia, essa conferência vai apresentar os trabalhos de Urânia Munzanzu e Taís Amordivino a partir da perspectiva conceitual e política de um “fazer arte negra” que tem nome: o “Cinema de Cozinha”.


O curso livre “A questão racial na formação da sociedade brasileira: colonização, racismo e antirracismo em Florestan Fernandes e Lélia Gonzalez” terá como conferencista Aristeu Portela Júnior, professor da Universidade Federal Rural de Pernambuco e doutor em Sociologia pela Universidade Federal de Pernambuco, e será realizado em formato virtual no dia 29 de abril de 2022, às 16h (horário de Brasília).

Resumo: Este trabalho tem como proposta analisar a questão racial como fundante da formação social brasileira, a partir de um diálogo com os pensamentos de Florestan Fernandes e Lélia Gonzalez. Serão abordados, de um lado, as contribuições de Fernandes para o delineamento dos padrões societários relativos às desigualdades e discriminações raciais que se atualizam no Brasil moderno; e, de outro, as críticas de Lélia Gonzalez ao nosso modelo de colonização e suas consequências em termos da constituição de modos de racismo, identidades raciais e práticas antirracistas. O conceito de “mito da democracia racial” une os polos dessa investigação, que busca refletir sobre sua pertinência e eficácia para a compreensão da questão racial no Brasil contemporâneo.


O curso livre “Emergência Indígena no Brasil contemporâneo” terá como conferencista Fátima Silveira, doutoranda em sociologia na Universidade de São Paulo, e será realizado em formato virtual no dia 27 de maio de 2022, às 16h (horário de Brasília).

Resumo: Até o final da década de 1970 prevalecia no Brasil a total invisibilidade dos povos indígenas, sustentada pela ideia de que esses povos iriam desaparecer, seja pela completa extinção seja por sua assimilação forçada à sociedade nacional, quando desapareceriam enquanto povos culturalmente distintos em um processo irremediável de “aculturação progressiva” (cf. Darcy Ribeiro em “Os índios e a civilização: a integração das populações indígenas no Brasil moderno”). Desconsiderados enquanto atores históricos, os povos indígenas eram vistos como vítimas de um processo histórico no qual só lhes cabia assistir o seu próprio fim de mundo. A tese da extinção apoiava-se na visão colonial quase unânime do pensamento brasileiro à época que concebia os povos indígenas como uma humanidade primitiva fadada a sucumbir com o avanço da “civilização”. Lado a lado com essas representações acerca do futuro dos povos indígenas no país, os militares promoviam um ataque brutal contra esses povos por meio de uma ampla política genocida e etnocida que visava acelerar e completar esse processo de extermínio (cf. Viveiros de Castro em “No Brasil todo mundo é índio, exceto quem não é”). No ápice desses acontecimentos, no final da década de 1970, os povos indígenas se levantaram, se organizaram e emergiram na cena política brasileira como protagonistas da sua história, lutando pelo seu reconhecimento e alcançando, na Constituição Federal de 1988, o seu direito à diferença, ao território e à existência (cf. Poliene Bicalho em sua tese de doutorado “Protagonismo Indígena no Brasil: Movimento, Cidadania e Direitos (1970 – 2009)”). Desde então, os povos indígenas vêm crescendo em termos demográficos e se tornando um dos atores políticos principais da cena política brasileira, tornando-se também o alvo central do capitalismo predatório e da política genocidaem curso desde a eleição, em 2018, do ex-militar expulso do Exército e defensor da tortura, Jair Bolsonaro. Tendo em vista essas questões, o objetivo dessa conferência é refletir sobre a emergência indígena no Brasil contemporâneo e sobre as questões que ela coloca ao debate político e intelectual no país.